segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Os outros

Quando decidimos percorrer este caminho sozinhos, como casal, o mais difícil de suportar, depois da ansiedade emocional, são os outros: (Ai os outros...)
  • A família, que insiste em perguntar incessantemente quando é que fazemos um puto...
  • Os amigos, que nos mandam aproveitar a vida ao máximo porque ainda somos muito novos...
  • Os conhecidos, que de quando a quando nos encontram na rua e fazem questão de colocar a sua expressão mais horrorizada quando percebem que ainda não há bebés por aqui...
  • Os estranhos, aqueles que não fazem a mais pequena ideia da nossa vida mas que se acham no direito de traçar teorias horrendas para o facto de um jovem casal ainda  não ter filhos... (e acreditem que estes são os mais crueis, são pessoas tão despromovidas de vida própria que chega a ser hilariante ouvir as pérolas de sabedoria destas pessoas)
 

E, durante este processo, tornamo-nos bons poetas, bons fingidores da nossa própria dor, como diria o nosso grande Fernando Pessoa.
Adquirimos a capacidade de sorrir quando apenas nos apetece chorar, adquirimos a capacidade de fazer os outros acreditar que está tudo bem, quando o nosso coração teme que esteja tudo mal, e decoramos (na ponta da língua, qual tabuada dos 9) as respostas que sabemos que os outros estão preparados para ouvir:

Ah, ainda é cedo...
Ah, ainda não estamos a pensar nisso...
Um dia destes...
É... Para o ano começamos a pensar nisso...
Pois, exacto... Queremos, claro... É, estamos a pensar... Sim... Isso...

Porque ninguém está realmente interessado em saber:
- Sim, estamos a tentar há praticamente um ano e ainda nada... é verdade, fazer um bebé não é assim tão fácil como na telenovela nova da noite em que a fulana pobre bebe três cervejas, dorme com o fulano rico e nove meses depois lhe bate à porta a pedir uma pensão de alimentos... Pois que não, ainda não temos filhos! Mas muito obrigada pela preocupação!


"                         
O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente
                            "
Fernando Pessoa (1931)
PL

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